Pesquisa de alterações cardiovasculares e caracterização de pacientes usuarios e ex-usuarios de cocaina e/ou derivados
por OLIVEIRA, Daniela Camargo de em
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No Brasil, o consumo de cocaína e derivados intensificou-se nas últimas décadas. Em 2001, 1.076.000 de pessoas admitiram o uso prévio. O uso abusivo evidenciou eventos cardiovasculares associados a tais substâncias. Para pesquisar alterações cardiovasculares e fatores de risco, este estudo observacional transversal avaliou pacientes usuários e ex-usuários de cocaína e derivados, atendidos pela disciplina de psiquiatria do Hospital de Clínicas da Universidade Estadual de Campinas, entre novembro de 2004 e abril de 2006. Estes foram encaminhados para tratamento de dependência química e não por sintomas cardiovasculares como queixa principal. Inclusos 40 usuários menores de 70 anos, e excluídos portadores de doenças limitantes à realização dos exames do protocolo. Submeteram-se à avaliação de consumo, abstinência e caracterização amostral por meio de questionário. Seguiu-se anamnese geral, direcionada e exame físico. Solicitados: radiografia de tórax; avaliação laboratorial; eletrocardiograma; ecocardiograma com Doppler, fluxo a cores e Doppler tecidual; teste ergométrico e avaliação de reatividade endotelial por vasodilatação mediada pelo fluxo, segundo as diretrizes da American College of Cardiology. Quando indicado, os pacientes foram encaminhados para investigação invasiva e tratamento de fatores de risco. A análise estatística determinou médias, mediana e porcentagem de ocorrência de eventos e utilizou-se o teste X ² e Teste Exato de Fisher para avaliar significância estatística entre ocorrência de eventos pouco freqüentes. A amostra constituiu-se de maioria homem, branco, solteiro, com idade entre 17 e 50 anos (média de 32,25), com comorbidades mais freqüentes: litíase renal, rinossinusite, DPOC e hepatite tipo C. Os consumos de tabaco (fator de risco cardiovascular mais prevalente) e álcool, iniciados em idade escolar, com freqüência de 82,5% e 89,7% respectivamente; o de canabis ativa de 97,5%, sendo a maioria usuária de outras substâncias psicoativas e consumidora de mais de uma droga simultaneamente. O consumo de cocaína, de início mais tardio e freqüência de uso maior que cinco dias por semana, sendo o consumo em pó e crack admitido por 67,5% dos pacientes. Quanto à presença de sintomas, a angina típica relacionou-se a maior risco de eventos isquêmicos (P=0.003), mas tende a ser minimizada pelos usuários. O exame físico não apresentou alterações significativas relacionadas ao consumo. Ao realizarem os exames, os pacientes apresentavam abstinência média de 88 dias e mediana de 30 dias. O exame laboratorial que se relacionou ao uso de cocaína e derivados foi proteína C reativa. O eletrocardiograma e o teste ergométrico não apresentaram alterações significativas. Ao ecocardiograma as alterações encontradas foram compatíveis com dados da literatura. A presença de alteração de reatividade endotelial mediada pelo fluxo foi detectada em 71% dos pacientes, e a abstinência menor que 60 dias foi estatisticamente significativo (p=0,002), podendo indicar ação tóxica ao endotélio, levando a menor vasodilatação endotélio dependente, aumentando o risco cardiovascular destes pacientes. Ao cateterismo cardíaco evidenciaram-se lesões obstrutivas significativas em dois casos, já suspeitos de isquemia, pela anamnese dirigida e exames iniciais. Não foi possível a avaliação prospectiva de 64% dos pacientes que não atenderam à reconvocação